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Padre Elílio de Faria Matos Júnior
De acordo com a visão de Padre Vaz, ninguém pode negar a realidade da dimensão espiritual do homem sem cair em contradição. O argumento de retorsão é, nesse sentido, utilizado por Padre Vaz para fazer ver que não se pode negar a dimensão espiritual sem ter de supô-la em exercício no ato mesmo da negação. O argumento de retorsão, na verdade, foi usado na Antiguidade por Aristóteles para silenciar os negadores do princípio de não-contradição. Padre Vaz sustenta que o mesmo argumento é capaz de reduzir ao silêncio os negadores do espírito. Com efeito, Padre Vaz leva em conta, no discurso da antropologia filosófica, a autoposição do sujeito, que leva adiante o movimento dialético da passagem da Natureza à Forma. O Eu sou se afirma, e, no movimento de autoafirmação – também chamado de momento tético -, interroga-se e põe-se a si mesmo em questão na busca de compreender-se a si mesmo – o que é o homem? Ora, no movimento mesmo de autoafirmação, o homem experimenta-se como razão e liberdade, isto é, como ser espiritual. No caso de um Espírito infinito, a reflexibilidade seria absoluta, de modo a garantir a identidade entre ser e reflexão. No caso do espírito finito – o homem -, a reflexão não é idêntica ao ser, ou, dito de outro modo, “há diferença dialética na identidade entre ser e ser refletido, e essa diferença pode então assumir a forma de uma questão do espírito que reflete sobre si mesmo: ‘O que é o homem?’ ou ‘o que é o espírito?’”.[1] Ao interrogar-se a si mesmo, o homem, segundo Padre Vaz, compreende sua natureza racional e livre, isto é, a sua estrutura espiritual.[2] Não se pode exercer o ato de interrogar-se sem experimentar-se como razão que procura compreensão e como liberdade que elege a reflexão. Nesse sentido, quem nega a estrutura espiritual do homem acaba afirmando-a in acto exercito, uma vez que negá-la é interrogar-se, e o homem não pode levar adiante uma interrogação sobre si mesmo sem se compreender como ser racional e livre ou como ser capaz de refletir sobre si mesmo. Como entender de outro modo a reflexão, senão como ato de razão e de liberdade? Assim, a negação da dimensão espiritual do homem termina numa contradição performativa. Padre Vaz conclui assim o raciocínio sobre a pretensão de negar o espírito no homem: “Ousando essa negação o homem exila-se a si mesmo na mudez do vegetal”.[3]
Padre Elílio de Faria Matos Júnior
De acordo com a visão de Padre Vaz, ninguém pode negar a realidade da dimensão espiritual do homem sem cair em contradição. O argumento de retorsão é, nesse sentido, utilizado por Padre Vaz para fazer ver que não se pode negar a dimensão espiritual sem ter de supô-la em exercício no ato mesmo da negação. O argumento de retorsão, na verdade, foi usado na Antiguidade por Aristóteles para silenciar os negadores do princípio de não-contradição. Padre Vaz sustenta que o mesmo argumento é capaz de reduzir ao silêncio os negadores do espírito. Com efeito, Padre Vaz leva em conta, no discurso da antropologia filosófica, a autoposição do sujeito, que leva adiante o movimento dialético da passagem da Natureza à Forma. O Eu sou se afirma, e, no movimento de autoafirmação – também chamado de momento tético -, interroga-se e põe-se a si mesmo em questão na busca de compreender-se a si mesmo – o que é o homem? Ora, no movimento mesmo de autoafirmação, o homem experimenta-se como razão e liberdade, isto é, como ser espiritual. No caso de um Espírito infinito, a reflexibilidade seria absoluta, de modo a garantir a identidade entre ser e reflexão. No caso do espírito finito – o homem -, a reflexão não é idêntica ao ser, ou, dito de outro modo, “há diferença dialética na identidade entre ser e ser refletido, e essa diferença pode então assumir a forma de uma questão do espírito que reflete sobre si mesmo: ‘O que é o homem?’ ou ‘o que é o espírito?’”.[1] Ao interrogar-se a si mesmo, o homem, segundo Padre Vaz, compreende sua natureza racional e livre, isto é, a sua estrutura espiritual.[2] Não se pode exercer o ato de interrogar-se sem experimentar-se como razão que procura compreensão e como liberdade que elege a reflexão. Nesse sentido, quem nega a estrutura espiritual do homem acaba afirmando-a in acto exercito, uma vez que negá-la é interrogar-se, e o homem não pode levar adiante uma interrogação sobre si mesmo sem se compreender como ser racional e livre ou como ser capaz de refletir sobre si mesmo. Como entender de outro modo a reflexão, senão como ato de razão e de liberdade? Assim, a negação da dimensão espiritual do homem termina numa contradição performativa. Padre Vaz conclui assim o raciocínio sobre a pretensão de negar o espírito no homem: “Ousando essa negação o homem exila-se a si mesmo na mudez do vegetal”.[3]
Para Padre Vaz, sem o reconhecimento da estrutura espiritual, “o discurso filosófico sobre o homem pende abruptamente, partido e inconcluso”.[4] Ora, só a categoria do espírito pode explicar a homologia do homem com o ser em sua amplitude transcendental. Se o dinamismo do Eu sou ultrapassa o complexo psicossomático para se abrir ao horizonte do ser que não conhece limites, então não se pode interromper o discurso filosófico sobre o homem nem na sua dimensão somática nem na sua dimensão psíquica; antes, torna-se imperioso reconhecer que tal dinamismo leva a Antropologia filosófica a cruzar-se com a Metafísica, a ciência do ser como tal, cuja condição de possibilidade lança raízes na estrutura mesma do homem, que se revela capax entis. A homologia do homem com o ser leva o homem, ser situado e finito, a uma relação dinâmica com o infinito, relação esta denominada relação de transcendência por Padre Vaz. Desse modo, pode-se dizer com Pascal que “o homem ultrapassa infinitamente o homem”.
Contudo, deve-se ter presente que, segundo Padre Vaz, a abertura do espírito humano ao ser em toda sua amplitude ilimitada não significa a identificação real do homem com o ser, mas tão somente a identificação intencional. No caso de um Espírito infinito, haveria identificação real do ser com o espírito, identificação já reconhecida na famosa afirmação de Parmênides: “Ser e pensar são o mesmo”. Ora, a Metafísica é uma ciência humana e, por isso, limitada. O homem é espírito, mas não é o Espírito infinito. Como ser situado e limitado, é espírito-no-mundo.[5] Assim, sendo espírito finito, o homem deve receber de fora o conteúdo de seu pensar; tal conteúdo sempre será pensado no horizonte do ser em sua amplitude ilimitada, para qual o espírito se abre, e o espírito não descansará enquanto não atingir, de alguma maneira, a unidade aboluta para qual tende, uma vez que o horizonte do ser absoluto é o horizonte da unidade absoluta. Padre Vaz vê nessa tendência à unidade absoluta uma participação do espírito finito ao Espírito infinito, no qual tal unidade se realiza de maneira perfeita.[6] Isso leva a dizer que o homem só se realiza adequadamente como ser espiritual por algum tipo de união com o Absoluto, que é Unidade absoluta e causa da tendência à unidade própria do espírito humano. A metafísica prorrompe, assim, em mística.[7] Como quer que seja, uma vez que não há entre o espírito humano e o ser em sua infinitude uma identificação real, mas apenas intencional, não é dada ao espírito humano a intuição numenal do ser, que é também verdade e bem. O ser, a verdade e o bem, como são termos logicamente conversíveis, realizam sua unidade no Absoluto real, que é Ser, Verdade e Bem subsistentes em real identidade e formal diferença. Mas de tal Ser real, o espírito finito, por vias naturais, não pode ter intuição numenal.[8] A via que lhe está aberta para o Absoluto real, para o qual tende, é exatamente sua identificação intencional com o ser, que o leva a agir – daí o dinamismo do espírito humano – a fim de que, através do absoluto formal, alcance um certo conhecimento analógico do Absoluto real e nele repouse como o Fim de sua tendência.
[1] AF I, 218.
[2] AF I, 218.
[3] AF I, 218.
[4] AF I, 202.
[6] “Correlativo ao ser, o espírito é correlative ao uno, e a convertibilidade lógica dos dois termos (ens et unum convertuntur) postula o Uno absoluto como princípio (arqué) do ser, e portanto, o Espírito como Uno absoluto do qual procede toda unidade (relativa)” (AF I, 210).
[7] Sobre o livreto.
Parabéns pela bela redação e pela escolha da temática padre.
ResponderExcluirRemete ao romance de Saramago quando o mesmo cita que a ilha desconhecida lançou-se ao mar em busca de si.
É preciso compreender a limitação humana que tenta diluir-se no absoluto e só desse modo está para além de si. Assim como a ilha que lança-se ao mar para conhecer a si mesma.
"A metafísica prorrompe, assim, em mística."
Eis aí a revelação que as palavras não abarcam.
Um abraço.