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Caraça

 A Parte I – Caraça do Irmão Lourenço (1770–1819), no livro Caraça: Peregrinação, Cultura e Turismo, de Pe. José Tobias Zico C.M., constitui a narrativa fundacional da história do Caraça, com forte tom memorialista, documental e espiritual. A seguir, apresento um resumo estruturado dessa seção:





Parte I – Caraça do Irmão Lourenço (1770–1819)




1. O que é o Caraça?



  • Situado no coração de Minas Gerais, a 1.400 m de altitude, o Caraça é descrito como lugar de silêncio, solidão e santidade, que por 200 anos atraiu pessoas para oração, estudo e convivência.
  • O autor ressalta o impacto histórico e formativo do Colégio, fundado em 1820 e fechado após o incêndio de 1968, mas que ainda mantém seu papel como Santuário e centro cultural.
  • É chamado por Juarez Caldeira Brant de “mais velho que o Império”, contemporâneo de Tiradentes.




2. Quem foi o Irmão Lourenço?



  • Nome religioso: Irmão Lourenço de Nossa Senhora.
  • Origem provável: português, natural de Nagozelo (diocese de Lamego), filho de Antônio Pereira e Ana de Figueredo.
  • Lenda: supostamente pertencente à família Távora, teria fugido da perseguição do Marquês de Pombal e se ocultado no Brasil.
  • Em 1763, já estava em Diamantina, tendo feito profissão na Ordem Terceira de São Francisco.
  • Em 1770, transfere-se para a Serra do Caraça, onde inicia a fundação de um hospício e capela com recursos próprios e esmolas dos fiéis.
  • Seu testamento de 1806 doa todos os bens ao Príncipe Regente para fundação de um hospício missionário.




3. O testemunho de Saint-Hilaire (1816)



  • O naturalista francês Auguste de Saint-Hilaire visitou o Caraça e descreveu:
    • A paisagem: planície circular cercada de altas montanhas, águas vermelhas (de ouro), vegetação rica, clima ameno.
    • O edifício: igreja barroca com duas alas simétricas, tribuna com órgão, prataria, relíquias (inclusive um corpo de cera de São Pio).
    • A figura do Irmão Lourenço: velho, cego, frágil, mas com olhos ainda vivos e fala reflexiva; exprime preocupação com o futuro da obra.




4. Últimos anos e morte do fundador



  • Preocupado com a continuidade da missão, tenta trazer padres da Congregação da Missão (Vicentinos) para o Caraça.
  • Em seu testamento reitera o desejo de que o local sirva a um seminário missionário.
  • Morre em 27 de outubro de 1819, provavelmente entre 92 e 100 anos, e é sepultado na igreja do Santuário.
  • Relatos da época falam de sofrimento, cegueira, abandono, mas também de consolo espiritual pela aparição da Virgem Maria, garantindo a continuidade da missão.




5. Grandeza espiritual e histórica



  • O autor insiste que o Caraça nasceu de um gesto solitário, heroico e místico de um homem que se retirou do mundo para servir a Deus e à formação religiosa.
  • O Irmão Lourenço é visto como um símbolo da fundação espiritual do Brasil profundo, onde fé, cultura e missão se entrelaçam.

A Parte II – Caraça dirigido pelos Padres Portugueses (1820–1854) narra o período de transição do santuário fundado pelo Irmão Lourenço para uma instituição robusta sob os cuidados da Congregação da Missão, conhecida como Padres Lazaristas ou Vicentinos, vindos de Portugal. A seção apresenta a implantação das missões populares e do célebre Colégio do Caraça. A seguir, o resumo estruturado:



Parte II – Caraça Português (1820–1854)


1. Chegada dos Missionários

Dois padres portugueses, Pe. Leandro Rebelo Peixoto e Castro e Pe. Antônio Ferreira Viçoso, chegam ao Brasil em 1819, chamados por D. João VI para as missões no Mato Grosso.

Descobrem o testamento do Irmão Lourenço, cuja finalidade coincide com a missão de sua Congregação: evangelização dos pobres e formação de sacerdotes.

D. João VI, por Carta Régia de 31 de janeiro de 1820, autoriza-os a assumir o Caraça, suprimindo a antiga proibição de ordens religiosas em Minas Gerais.


2. Tomada de posse e primeiras iniciativas

Em 15 de abril de 1820, chegam ao Caraça e são calorosamente acolhidos.

No mês seguinte, o Ouvidor de Sabará lhes confere a posse legal da Casa, terras e bens.

Iniciam suas atividades com missões populares e reconhecimento da região.



3. As Missões Populares

Inspiradas em São Vicente de Paulo, as missões visam a conversão, catequese e organização cristã das comunidades.

Atividades incluem: confissões, catequese, sermões sobre os Novíssimos, ensino moral e prático, visita aos doentes e pobres.

Pregam virtudes sociais, justiça nas relações econômicas, combate aos vícios e incentivo à vida cristã autêntica.



4. Fundação do Colégio do Caraça (1821)

Após missão em Barbacena, Pe. Leandro retorna com:

4 jovens para alunos

3 sacerdotes (2 vicentinos e 1 secular)

O colégio é oficialmente aberto com 14 alunos.

Em 1824, D. Pedro I concede o título de “Imperial Colégio do Caraça”.

O número de alunos cresce rapidamente: 85 (1824), 113 (1825), 150 (anos seguintes).


Regulamento Pedagógico

Baseado em modelos dos Jesuítas e valores vicentinos.

Enfatiza:

Formação humana e espiritual

Disciplina sem violência

Personalização do ensino

Estudo das línguas clássicas e ciências

Tristão de Ataíde considerou o regulamento “admiravelmente atual”, destacando a pedagogia ética e o respeito ao aluno.



5. Dificuldades e perseguições


Crises enfrentadas pelos Lazaristas

1. Crise interna da Congregação (1800–1827)

Divisões causadas pelas Guerras Napoleônicas e pela perda de comunicação com os superiores franceses.

Reorganização e autogoverno no Brasil, com os padres do Caraça assumindo autoridade local.

2. Leis Imperiais contrárias às ordens religiosas

O Padroado e o Placet Regio limitavam a ação da Igreja.

A Constituição de 1824 e o Código Criminal de 1831 dificultavam a subordinação a superiores estrangeiros.

Em 1824, o governo declarou que o Caraça deveria se desligar da casa-mãe em Lisboa.

3. Calúnias e perseguições políticas

Acusados de serem “jesuítas disfarçados” e “portugueses antinacionais”.

Padres redigem um Manifesto (1828) defendendo sua legitimidade, sua fidelidade ao Império e sua independência política.

Afirmam viver da providência, sustentando missões e colégio com muito sacrifício.



6. O “Berço Vazio” (1842)

Revolta Liberal de 1842 (Teófilo Otoni x Caxias) ameaça a segurança do Caraça.

Pe. Viçoso decide transferir o colégio para Campo Belo, levando padres, irmãos, alunos e até animais, em verdadeira peregrinação.

O episódio é poeticamente descrito pelo Pe. Sarneel como a “imagem de um berço vazio”.



7. Grandes figuras do período

Pe. Leandro: fundador do Colégio, superior por dois mandatos, missionário respeitado, falece em 1841.

Pe. Viçoso: missionário, educador, depois Bispo de Mariana e hoje Servo de Deus, com causa de beatificação em andamento.

Ambos são considerados os grandes organizadores da vida vicentina no Brasil e os verdadeiros fundadores da etapa institucional do Caraça.



A Parte III – Caraça Francês (1854–1903), embora menos detalhada nos trechos disponíveis, aborda o período em que o Santuário e Colégio do Caraça estiveram sob a direção de padres franceses da Congregação da Missão, marcando uma continuidade institucional com renovação espiritual, pedagógica e arquitetônica. Abaixo, segue o resumo estruturado:





Parte III – Caraça Francês (1854–1903)




1. Contexto de transição



  • Após os desafios enfrentados pelos padres portugueses (perseguições legais, crises políticas e a Revolta Liberal de 1842), a Congregação da Missão buscou revigorar sua presença no Brasil com o envio de missionários franceses.
  • A transição também estava em consonância com a reorganização internacional da Congregação pós-Napoleônica e a consolidação de um novo quadro jurídico no Brasil após a consolidação do Segundo Reinado.




2. Restauração e reorganização



  • O período francês é marcado por um impulso de revitalização da obra educacional e missionária, agora com mais apoio institucional da Congregação da Missão internacional.
  • Os padres franceses se dedicam a:
    • Reestruturar o colégio após sua reabertura
    • Reformar e ampliar as instalações
    • Continuar as missões populares, agora em estilo sistematizado
    • Formar novos quadros locais, já preparando a futura transição ao “Caraça Brasileiro”




3. Ampliação do Colégio



  • O Colégio do Caraça retoma suas atividades com força renovada:
    • Alunos voltam a ocupar as instalações
    • Reafirma-se o modelo pedagógico vicentino, com exigência moral, disciplina intelectual e piedade
    • O ensino inclui filosofia, humanidades, línguas clássicas e ciências




Influência cultural e religiosa



  • Os missionários franceses trazem consigo:
    • O espírito renovado do catolicismo francês do século XIX, marcado pelo ultramontanismo e a devoção ao Sagrado Coração
    • Novas formas de espiritualidade e piedade litúrgica
    • Estilo arquitetônico que contribui para a fusão entre o gótico e o colonial mineiro nas estruturas do Santuário




4. Continuidade da missão



  • Durante este período:
    • O colégio continua formando seminaristas e leigos cultos
    • As missões populares são mantidas em Minas Gerais e em outras regiões
    • O Caraça reforça sua vocação como centro espiritual e educativo de projeção nacional




5. Prelúdio da nacionalização



  • O fim do período francês marca a transição para uma nova fase, com o progressivo surgimento de vocações brasileiras e padres nacionais preparados para assumir a obra.
  • Essa transição culmina com a fase seguinte: o Caraça Brasileiro (1903–1975).





Este período é caracterizado por:


  • Internacionalização do projeto missionário do Caraça
  • Estabilização pedagógica e eclesial
  • Afirmação do estilo vicentino francês no Brasil

A Parte IV – Caraça Brasileiro (1903–1975), na obra Caraça: Peregrinação, Cultura e Turismo, de Pe. José Tobias Zico C.M., retrata a fase final da administração e vida pedagógico-religiosa do Colégio do Caraça antes de seu fechamento em 1968. Marca a transição para a brasilidade plena da obra vicentina, tanto em termos de pessoal quanto de identidade espiritual e educacional. Segue o resumo estruturado:





Parte IV – Caraça Brasileiro (1903–1975)




1. A nacionalização da direção



  • A partir de 1903, a direção do Caraça passa às mãos dos padres brasileiros da Congregação da Missão.
  • Esta mudança representa:
    • O amadurecimento do projeto iniciado pelo Irmão Lourenço
    • A confirmação de que o espírito missionário vicentino se enraizou no Brasil
    • A continuidade das obras educativas e evangelizadoras com vocações locais




2. O Colégio como formador de gerações



  • O colégio ganha renome nacional por sua excelência acadêmica e rigor moral:
    • Forma seminaristas, sacerdotes, líderes civis e intelectuais
    • Concilia fé, disciplina e cultura clássica
    • Torna-se referência em Minas Gerais e em todo o Brasil




Números e impacto



  • O colégio chegou a abrigar centenas de internos.
  • Em 1881, D. Pedro II foi recebido por 300 alunos.
  • Em 1953, havia 200 seminaristas ou apostólicos.




3. Vida espiritual e missionária



  • O santuário de Nossa Senhora Mãe dos Homens permanece como centro de devoção, peregrinação e oração.
  • A Congregação continua as missões populares em diversas regiões de Minas Gerais.
  • O Caraça funciona como centro espiritual, intelectual e pastoral.






4. O incêndio de 1968 e o fechamento



  • 28 de maio de 1968: um incêndio destrói parte significativa das instalações.
  • O colégio é encerrado oficialmente, encerrando um ciclo de quase 150 anos de atividades educacionais.
  • Apesar da perda, permanece o Santuário, a memória e a missão espiritual.




Consequências



  • Muitos ex-alunos, padres e leigos guardam viva a memória do colégio como “alma formadora”.
  • O local passa por um período de reestruturação com vistas ao futuro, sendo valorizado como patrimônio religioso e cultural.






5. A continuidade da missão: turismo, cultura e peregrinação



  • Mesmo sem o colégio, o Caraça continua a exercer função evangelizadora e cultural:
    • Recebe peregrinos, turistas, estudiosos e visitantes
    • É descrito como santuário natural, lugar de contemplação e reencontro com Deus e com a natureza
    • Preserva acervo histórico: biblioteca, pinturas, documentos, relíquias






Síntese da fase brasileira



  • A brasilidade do Caraça não significa ruptura com o passado, mas sua plenitude e maturação:
    • Continuam as obras iniciadas pelo Irmão Lourenço
    • São assimiladas e reformuladas as contribuições dos padres portugueses e franceses
    • Afirma-se o Caraça como patrimônio espiritual, educativo e cultural da nação brasileira






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