Pular para o conteúdo principal

Níveis ontológicos

Podemos considerar vários níveis ontológicos. A realidade é multifacetada e rica de níveis distintos de profundidade. Eis três níveis fundamentais para a inteligibilidade da estrutura do ente: 

a) a simples matéria, que é o de quê as coisas sensíveis são feitas. A matéria é moldável por si mesma. É o que permanece sob as diversas formas no processo das mudanças das coisas sensíveis.

b) a forma, que é o contorno inteligível das coisas. É a forma que dá o ser determinado das coisas. Sem a forma, nada teria inteligibilidade; nenhum ente seria possível, pois todo ente é um ente determinado, e a determinação (inteligibilidade) vem da forma. Pode-se aqui perguntar pelo fundamento da forma. Platão disse que tal fundamento radica-se num mundo superior, puramente inteligível. Agostinho sustentou que a mente de Deus é o fundamento de toda inteligibilidade. 

c) o ato de ser, que é aquilo pelo qual tudo o que existe, existe. Sem o ato de ser, nada seria efetivo. Este é o fundamento mais radical de todas as coisas. Está acima da forma, pois sem o ato de ser nenhuma forma seria efetiva. Aliás, sendo o ato de ser a perfeição das perfeições e o ato de todos os atos, lá onde ele é puro (em Deus), é perfeição infinita ou ilimitada, não determinada, mas superdeterminada. Nos entes, o ato de ser se dá de acordo com a determinação (limitação) da forma finita (essência). 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A morte de Jesus. Visão de Raymond Brown

  A visão de Raymond E. Brown sobre a morte de Jesus é uma das mais respeitadas no campo da exegese católica contemporânea. Brown foi um dos maiores especialistas em literatura joanina e autor da monumental obra The Death of the Messiah (1994, 2 vols.), que analisa de maneira técnico-teológica os relatos da Paixão nos quatro evangelhos. Seu trabalho é uma síntese rigorosa de crítica histórica, análise literária e teologia bíblica, sustentada por fidelidade à fé católica e abertura ao método científico. Abaixo, apresento um resumo estruturado da sua interpretação da morte de Jesus: ⸻ 1. A morte de Jesus como fato histórico e evento teológico Para Brown, a morte de Jesus deve ser compreendida em duplo registro:  • Histórico: Jesus foi condenado e crucificado por decisão de Pôncio Pilatos, sob a acusação de reivindicar uma realeza messiânica que ameaçava a ordem romana.  • Teológico: desde o início, os evangelistas narram a Paixão à luz da fé pascal, como o momento culminant...

A totalidade do Ser e o acesso filosófico a Deus em Lorenz B. Puntel

1. Introdução: a retomada da metafísica Lorenz B. Puntel insere-se no esforço contemporâneo de reabilitar a metafísica, mas de forma criativa, com um projeto que ele denomina de “nova metafísica”. Em vez de simplesmente repetir modelos do passado ou rejeitar a metafísica sob influência kantiana, positivista ou heideggeriana, Puntel busca um ponto de partida radical: a capacidade estrutural da mente de apreender a totalidade do ser. Esse deslocamento inicial é decisivo. A filosofia moderna muitas vezes concentrou-se na relação sujeito/objeto, nas condições da experiência ou nas linguagens que estruturam o pensamento. Puntel recorda que tudo isso já pressupõe algo mais originário: que sempre nos movemos no horizonte do ser como um todo. É essa totalidade que se torna o objeto próprio da nova metafísica. ⸻ 2. A dimensão epistemológica: o dado originário da razão A primeira tese é epistemológica: a apreensão da totalidade do ser é um fato originário da razão. Quando pensamos, não pensamos ...

Sobre os sacramentos - Mystérion, mystéria, sacramentum, sacramenta

Pontos histórico-teológicos importantes  Mystérion, mystéria, sacramentum, sacramenta  - O termo sacramento vem do latim sacramentum , que, por sua vez, é a tradução do grego mystérion . Mystéria é o plural de mystérion , assim como sacramenta é o plural de sacramentum .    - No uso pagão, mystérion é usado para referir-se a ensinamentos filosóficos que elevam o iniciado à suprema realidade ou a práticas cultuais ou representações sagradas que colocam o iniciado no âmbito da divindade (por exemplo, no culto de Ísis, Mitra ou Osiris). A raíz grega do vocábulo mysterion é myein , que significa fechar a boca, calar-se .  --Veja-se que em Elêusis, cidade da Grécia antiga, celebrava-se o culto de Deméter. Coré (grão de trigo), raptada por Plutão, desce ao mundo inferior (semeadura), e sua mãe Deméter, desesperada, corre à procura da filha destruindo tudo por onde passa (inverno). O deus Hélio (sol) sai ao encontro de Deméter para ajudá-la (...