Resumo do artigo “La thèse de l’herméneutique sur l’être” de Jean Grondin (2006)
Revue de Métaphysique et de Morale, n° 4, pp. 469–481
1. Problema central
Grondin busca esclarecer qual é, afinal, a tese da hermenêutica sobre o ser, especialmente tal como emerge na obra de Hans-Georg Gadamer. A reflexão parte do enunciado ambíguo:
“L’être qui peut être compris est langage” (O ser que pode ser compreendido é linguagem).
Esse adágio pode ser entendido como:
• (a) uma tese sobre a natureza da compreensão humana (ela é sempre linguística); ou
• (b) uma tese sobre o próprio ser (o ser mesmo se manifesta na linguagem).
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2. Críticas a leituras relativistas
Autores como Gianni Vattimo e Richard Rorty interpretam o adágio gadameriano de forma relativista e nominalista:
• O ser se reduz às interpretações históricas que dele fazemos.
• Não há acesso ao ser “em si”, mas apenas ao ser interpretado.
• O ser é entendido como uma construção linguística e histórica.
Grondin rejeita essa leitura, mostrando que ela contradiz o próprio Gadamer, que critica o nominalismo e o instrumentalismo da linguagem.
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3. A posição de Gadamer segundo Grondin
Para Grondin, Gadamer propõe uma ontologia da linguagem inspirada na metafísica medieval dos transcendentais:
• O ser se dá na linguagem, mas não se reduz a ela.
• Há um “linguagem do ser”, que é sempre maior do que qualquer expressão concreta.
• O ser se manifesta e se reflete nas nossas interpretações, que são plurais justamente porque o ser é inexaurível.
• Interpretação não é construção arbitrária, mas participação no ser que se oferece.
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4. A dimensão metafísica
Grondin destaca que a hermenêutica gadameriana tem uma dimensão metafísica forte:
• Recupera a relação originária entre ser e verdade, que é pré-subjetiva.
• A compreensão é vista como um momento do próprio ser, não apenas como ato do sujeito.
• A referência implícita é ao pensamento tomista e agostiniano: esse est intelligi.
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5. A “ontologização” da hermenêutica
Grondin propõe duas leituras complementares da hermenêutica gadameriana:
• Ontologização da hermenêutica: a linguagem nos dá acesso ao ser.
• Hermeneutização da ontologia: todo discurso sobre o ser é mediado pelo nosso horizonte linguístico e histórico.
Mas essa hermenêutica não é relativista, pois o ser é sempre mais do que nossas interpretações, e se manifesta nelas.
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6. Limite da hermenêutica gadameriana
Grondin observa uma tensão não resolvida:
• Gadamer não recorre ao fundamento teológico (como Tomás ou Agostinho) para garantir a adequação entre ser e linguagem.
• Isso suscita a questão: sem um fundamento teológico, é possível manter a confiança de que o ser se dá verdadeiramente na linguagem?
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7. Conclusão
A tese da hermenêutica sobre o ser, em Gadamer, deve ser compreendida ontologicamente:
• Não se trata de afirmar que o ser é apenas linguagem (relativismo),
• Mas de afirmar que o ser se manifesta em nossa linguagem e a ultrapassa,
• E que a linguagem é o lugar privilegiado onde o ser se dá a compreender.
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