Se não encontramos em nós mesmos as condições de possibilidade de receber uma luz de ordem metafísica; mais: se não reconhecemos em nós uma abertura dinâmica, um movimento para uma luz que em si mesma ultrapassa todas as exigências e expectativas puramente humano-mundanas; ou seja, se não reconhecermos que estamos já, de alguma maneira, para além do mundano e do meramente humano, todo o discurso da religião, com suas narrativas e dogmas, de modo especial nestes tempos de grandes mudanças, soará como obsoleto. Ou então estará simplesmente entregue ao sentimentalismo que não convence os espíritos mais exigentes ou ao fanatismo ou ao fundamentalismo que o desfiguram.
A revelação cristã não é simplesmente um pacote que cai abruptamente do céu sem nenhuma relação com o que o homem é em sua constituição íntima. Embora o conteúdo ou a finalidade da revelação ultrapasse toda medida humana, pois, em última análise, o seu objeto é a transformação em Deus, é graça pura, ela não encontra na constituição humana um terreno indiferente ou neutro. Ao contrário, o homem está aberto — ativa e dinamicamente aberto — a uma palavra ou a uma luz transcendente. Ele anseia por isso sem saber dar-lhe nome e conteúdo precisos.
Em seu ser humano, o homem já vive, de alguma maneira, para além do humano-mundano. É tomando consciência disso que o homem atual — esclarecido, informado das grandes conquistas dos saberes acumulados, conhecedor do fim das sociedades sacrais e habitante do clima desenhado pela ciência e pela técnica, também muitas vezes desiludido pela ondas de niilismo e irracionalismo — poderá ver que o que diz a religião em essência não perdeu a atualidade; antes, é de uma atualidade impressionante, só que de uma outra ordem, não daquela simplesmente pragmática.
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