A mística, que é o fim supremo da vida cristã, não tem nada a ver com aparições, visões, êxtases ou fenômenos extraordinários. Se acontecem essas coisas, trata-se de algo secundário, que não constitui a essência mesma da mística. Esta é um perder-se na divindade, um deixar- se absorver no oceano sem limites do Ser (pelagus essendi), que é também Amor (ignis ardens caritatis). A mística pode adquirir feições mais intelectuais, mais afetivas ou mais práticas, mas em uma forma ou outra sempre terá a dimensão da visão: é preciso estar consciente da quase fusão com a divindade, vendo com os olhos da alma a sua Beleza; a dimensão do coração: a união com o Absoluto é tão transformante que reordena os afetos da alma, que se concentra tanto na fonte do Amor (ignis originarius) que acaba quase não mais sentindo aquela necessidade própria do homem de receber dos outros algum afeto para que possa transmitir afeto; a alma se sente plena e transbordante do afeto divino; e a dimensão do agir: a união da alma com o Absoluto reverbera nas atitudes e na ação.
A filosofia ocidental nasce da exigência de compreender o ser. Platão, diante do mundo sensível, marcado pelo devir, pela transformação incessante e pela imperfeição, percebeu os limites da realidade material. Para ele, o mundo visível não pode explicar-se por si mesmo: sua contingência só se torna inteligível à luz de um mundo superior, estável e perfeito — o mundo das Ideias. Assim, o imperfeito remete necessariamente ao perfeito. Aristóteles, discípulo de Platão, volta-se de modo mais atencioso para o mundo sensível. Não nega sua inteligibilidade, mas a fundamenta em princípios racionais: a substância, a forma, a matéria, as causas. O cosmos é compreensível porque é ordenado. Contudo, esse movimento ordenado exige um fundamento último que não se move: o motor imóvel. Aristóteles não o descreve como criador, mas como ato puro, causa final de toda realidade em movimento. Com o cristianismo, a intuição filosófica do Princípio se eleva a um plano novo. Antes de tudo, o cristianismo não ...
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