Pular para o conteúdo principal

Extra Ecclesia nulla salus?


Padre Elílio de Faria Matos Júnior

É possível que alguém se salve fora da Igreja católica?
Sim, é possível que alguém se salve fora das estruturas visíveis da Igreja católica. Pio XII o ensinava ao condenar, em seu tempo, o exclusivismo eclesiológico que julgava não haver tal possibilidade. Deus quer a salvação de todas as pessoas e dispõe de meios só dele conhecidos para chegar ao coração de cada um. Ademais, a prece universal da Igreja pede ao Senhor a salvação de todos os povos.

Mas então tanto faz pertencer ou não à Igreja católica? 
Não. A Igreja, através dos Santos Padres, dos Concílios, dos Papas e dos grandes teólogos, sempre ensinou que devemos procurar a verdade religiosa, e, uma vez conhecida, abraçá-la de coração. Tal verdade foi confiada à Igreja católica, para que a conservasse e difundisse. Assim, não é indiferente pertencer ou deixar de pertencer à Igreja católica. Se existe uma verdade religiosa, eu não posso pensar e agir como se ela não existisse. O Concílio Vaticano II ensina que a plenitude da verdade religiosa foi confiada somente à Igreja católica, não por mérito dos católicos, mas como dom de Deus ao mundo. Os católicos, muitas vezes, não estão à altura desse grande dom e o empalidecem aos olhos do mundo por causa de seus pecados. Mas o dom está sempre disponível, visível no seio da Igreja que Cristo convocou ao chamar os apóstolos e ordenar-lhes que pregassem o Evangelho e celebrassem os santos mistérios.

Como entender a relação da Igreja com Cristo?
A Igreja é inseparável de Cristo. Querer Cristo e rejeitar a Igreja, que é seu Corpo Místico, significa não querer o Cristo tal como ele se revelou ao mundo. Na festa de Santo Inácio de Loyola (31 de julho de 2013), o Papa Francisco disse aos jesuítas que "à centralidade de Cristo corresponde também a centralidade da Igreja: são dois focos que não se podem separar: não posso seguir Cristo, a não ser na Igreja e com a Igreja" (cf. "http://w2.vatican.va/content/francesco/pt/homilies/2013/documents/papa-francesco_20130731_omelia-sant-ignazio.html). A Igreja não é uma mera instituição organizada por homens. Na sua realidade mais profunda atua o mistério de Deus que fez uma aliança definitiva com os homens e se deu de modo irrevogável em Cristo, cujos sinais sacramentais existem na Igreja, nunca sem ela.

A Igreja ainda ensina o princípio Extra Ecclesia nulla salus (Fora da Igreja não há salvação)?
Esse é um princípio sempre válido, que o Vaticano II assumiu. Mas requer um entendimento adequado. Em linha de princípio, ele quer dizer que a Igreja é necessária para a salvação em virtude de seu nexo íntimo com o mistério da Redenção. A Igreja não é um simples acessório no Plano de Deus. Por isso, se eu tenho consciência de que Deus quis a Igreja como casa de salvação e, mesmo assim, não quero nela entrar ou nela perseverar, coloco em risco a minha salvação. De outro lado devemos saber que muitas pessoas, sem culpa, ignoram (por diversas razões) a centralidade da Igreja no Plano de Deus, e, por isso, não fazem (não podem fazer) parte dela. Essas pessoas, se cultivam a fidelidade à própria consciência, na abertura a Deus que lhes fala através de diversos meios só dele conhecidos, podem encaminhar-se à perfeição, viver na amizade de Deus e alcançar a salvação. Podemos dizer que pertencem ao coração ou à alma da Igreja.

Comentários

  1. Bastante simples e didática sua exposição, Pe. Elílio. Compartilharei.

    ResponderExcluir
  2. = ... Igreja NÃO É uma instituição ritualista... legalista... moralista...
    = ... Igreja É = Comunidade de pessoa ... com um Pastor que procura até dar a vida pelos perdidos...

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

A autoridade papal fica de pé

O episódio ocorrido na noite de Natal deste ano na Basílica de São Pedro em Roma é, de certa forma, um símbolo dos tempos atuais. O Papa, Vigário de Nosso Senhor Jesus Cristo na Terra, cai. A mitra, símbolo de sua autoridade, rola no chão. A férula, que representa a sua missão de pastor universal, é derrubada pelo homem moderno, desorientado, confuso e como que fora-de-si. Louca ou não, a jovem de 25 anos que provocou o incidente bem representa o mundo de hoje, que joga por terra a autoridade e as palavras do Romano Pontífice, que, na expressão da grande Santa Catarina de Siena, é «o doce Cristo na Terra». A jovem é louca? Não sei. Mas sei que o é, e muito, o mundo que rejeita Deus e o seu Cristo para abraçar o vazio e caminhar nas trevas. Bento XVI se ergue rápido e continua seu caminho. Celebra a Santa Missa, que é o que há de mais sublime sobre a face da Terra, rende o verdadeiro culto a Deus e conserva-se em seu lugar, como pastor colocado à frente do rebanho pelo Pastor Eterno, ...

Ciências, ateísmo e Richard Dawkins

Richard Dawkins, biólogo inglês, é hoje um dos grandes nomes do ateísmo militante. Sua defesa do ateísmo pretende ter por fundamento sobretudo as ciências naturais, notadamente a biologia. Sustenta, em linhas gerais, que o mundo, tal como as ciências naturais o consideram, basta-se a si mesmo, e tudo o que nele há de diversificado e maravilhoso é resultado do dinamismo do próprio mundo posto em movimento. Entretanto, cabe uma pergunta: será possível abraçar a doutrina atéia a partir das ciências naturais? Para ser direto, devo dizer: as ciências naturais, de si, não nos permitem nem afirmar nem negar a existência de Deus . Sim, essas ciências têm uma metodologia e estatuto próprios que lhes dão competência em uma área determinada da realidade, mas que também lhe tiram a competência para outras dimensões do saber. Elas podem alcançar certa dimensão da realidade, mas não a realidade toda. As ciências que têm por objeto a realidade como um todo são a filosofia e a teologia; esta base...

Considerações em torno da Declaração "Fiducia supplicans"

Papa Francisco e o Cardeal Víctor Manuel Fernández, Prefeito do Dicastério para a Doutrina da Fé Este texto não visa a entrar em polêmicas, mas é uma reflexão sobre as razões de diferentes perspectivas a respeito da Declaração Fiducia supplicans (FS), do Dicastério para a Doutrina da Fé, que, publicada aos 18 de dezembro de 2023, permite uma benção espontânea a casais em situações irregulares diante do ordenamento doutrinal e canônico da Igreja, inclusive a casais homossexuais. O teor do documento indica uma possibilidade, sem codificar.  Trata-se de uma benção espontânea,  isto é, sem caráter litúrgico ou ritual oficial, evitando-se qualquer semelhança com uma benção ou celebração de casamento e qualquer perigo de escândalo para os fiéis.  Alguns católicos se manifestaram contrários à disposição do documento. A razão principal seria a de que a Igreja não poderia abençoar uniões irregulares, pois estas configuram um pecado objetivo na medida em que contrariam o plano div...