Niilismo, do latim nihil = nada.
Existe um niilismo teórico, um niilismo moral e um niilismo sócio-político. Não é fácil definir o niilismo com breves palavras. Há vários autores que lhe dão sentidos diversos. Mesmo um só autor, como Nietzsche, dá-lhe sentidos diferentes. O traço comum consiste certamente em que niilismo aponta para o nada, o vazio que assombra o homem e tenta devorá-lo.
O niilismo teórico diz que não se pode conhecer nada de estável ou de seguramente verdadeiro, pois que a verdade ou o ser verdadeiro ou é inacessível ou não existe. Acusa também a tradição filosófica e teológica ocidental de ter apresentado um saber metafísico e teológico falso, inventado, que não significa nada e, portanto, precisa ser desconstruído. Temos aqui dois sentidos diferentes: niilismo como impossibilidade de conhecer o verdadeiro ou mesmo como negação da existência do verdadeiro e niilismo como um conhecimento falso ou inventado.
O niilismo moral diz que não há valores morais absolutos. Tudo seria relativo à perspectiva de povos e indivíduos. Acusa o cristianismo, de modo especial, de ter introduzido valores que nada são e que anulam os valores da vida entendida como vida de instintos, de vontade de poder, feita, não da pureza do espírito, mas da impureza da carne e do sangue. Aqui também temos dois sentidos diversos: niilismo como negação de valores morais objetivos e niilismo como afirmação de pretensos valores morais objetivos.
O niilismo sócio-político vê que nada do que está aí pode salvar a sociedade de suas mazelas. Este tipo de niilismo leva facilmente ao terrorismo, à revolução e ao derramamento de sangue.
Segundo Nietzsche, o niilismo teria começado com Eurípedes e Sócrates na Grécia antiga. Eles começaram a racionalizar a vida, que, na sua essência, não teria nada de racional. Platão, discípulo de Sócrates, elaborou a teoria das ideias eternas e imutáveis, e, assim, teria desvalorizado o que verdadeiramente existe: o mundo caótico do vir-a-ser.
A vida em geral, e a humana em particular, segundo Nietzsche, seria feita de vontade de poder, isto é, de tendência constante à autoafirmação. Os indivíduos fortes, com instintos saudáveis, se autoafirmariam. Já os fracos, com instintos débeis, procurariam inventar um mundo invisível (Deus e os valores morais) para compensar sua fraqueza. Nesse sentido, teriam criado o nada. Os fracos seriam os primeiros niilistas, inconscientes de sê-lo. Mas a partir da modernidade, cada vez mais se teria percebido que o mundo metafísico e teológico não se sustenta. A vontade de verdade, inculcada pelos amantes do mundo invisível, teria destruído, uma por uma, todas as antigas persuasões que sustentavam a existência de Deus, da Verdade eterna e dos valores imutáveis.
Veio, então, o niilismo cosciente, mas incompleto: procurou-se substituir Deus, o garante do mundo invisível, pelos ideais de conhecimento científico certo e de progresso inabalável. O niilismo consciente completo aparece em seguida, quando se percebe que os ideais da ciência e do processo são também invenções, mitos sem consistência. O niilismo completo passivo promove a atitude de que nada vale a pena, de que tudo é ilusão; não restaria ao homem senão deixar de querer qualquer coisa (Schopenhauer).
Ao contrário, o niilismo completo ativo é o proposto por Nietzsche. Diz que, ao invés de tudo aquilo que inventa e projeta para além de si, que é nada, o homem deveria valorizar as próprias invenções enquanto invenções, não as projetando em algo objetivo, mas com a consciência de que são criações suas. O homem deveria fazer valer a sua vontade de potência para criar a sua própria vida como uma obra de arte, sabendo que não deve confiar em nada que seja estranho ao próprio movimento de autocriação humana. Com o niilismo completo ativo, Nietzsche acreditava ter superado o niilismo vazio que imobiliza o homem. Nietzsche propunha ao homem criar os seus próprios valores e dar ele mesmo um sentido à própria vida.
Para Heidegger, diferentemente, o niilismo é causado pelo esquecimento do Ser. Esse esquecimento teria começado já nos inícios da filosofia, com Platão. Esquecer-se do Ser significa confundi-lo com um ente. A metafísica ocidental teria transformado o Ser num ente — o ens summum, o ente supremo (Deus). Perguntando-se pelo sentido do Ser (ontologia), a metafísica teria colocado o seu fundamento no ente supremo (teologia). Esse caráter ontoteológico da metafísica teria encoberto o Ser mesmo, aplainando o caminho do homem para o domínio total do ente. Com Descartes, o processo de redução ao ente tomou o contorno explícito e agressivo da manipulação do ente pela primazia da consciência. Esse processo de esquecimento do Ser teria atingido o seu mais alto grau com Nietzsche, cujo conceito de “vontade de potência” é a expressão mais abrangente do domínio do homem sobre o ente. Vê-se, pois, que, segundo Heidegger, Nietzsche não supera o niilismo nem a metafísica ocidental, mas é a sua expressão mais acabada.
Emanuele Severino, por sua vez, acusa o próprio Heidegger de ser niilista e de promover o niilismo. Não só Heidegger é acusado, mas toda a filosofia ocidental. Severino vê que Parmênides começou a trilhar a estrada justa, mas logo foi “refutado” por Platão. O princípio de Parmênides seria o único verdadeiro: o ser é e não pode não ser; o não-ser não é e não pode ser. Platão, no entanto, defendeu uma passagem — impossível aos olhos de Severino — do não-ser ao ser e do ser ao não-ser. O devir entendido como oscilação entre o ser e o não-ser tornou-se a grande marca do pensamento ocidental. Como suporte do devir assim entendido, como remédio para o vir-a-ser que inquieta a alma, os filósofos, de Platão até Hegel, colocaram o Imutável, reconhecido ao término do trajeto do pensamento: o Bem, o Motor Imóvel, Deus, o Sujeito, o Espírito... No entanto, a oscilação entre o ser e o nada sempre foi uma evidência para a mente ocidental. E a força dessa suposta evidência teria levado a filosofia, a partir do século XIX, a negar qualquer Imutável. A suprema convicção da filosofia do nosso tempo, pensa Severino, é que o devir, entendido como passagem do ser ao nada, reina soberano e, portanto, não pode ser contrastado por nenhum Imutável. Eis o niilismo em sua máxima expressão. A metafísica do Imutável seria impossível porque a suprema verdade seria o devir como oscilação entre o ser e o nada. Ser e nada se confundiriam. Heidegger não supera o niilismo porque o Dasein heideggeriano é um ente que oscila entre o não-ser do antes de ser lançado no mundo e o não-ser para o qual caminha na morte. O ser heideggeriano é apenas uma projeção dos afetos inconstantes do Dasein. Severino propõe como antítodo ao niilismo a verdade do princípio de Parmênides: o ser é. O devir não seria passagem do não-ser ao ser e do ser ao não-ser, mas o aparecer e o esconder-se dos entes eternos no círculo da aparição. Para Severino, que vai até mais longe que Parmênides, cada ente é eterno. Parmênides falava da eternidade do Ser, mas não falava da eternidade dos entes. Severino sustenta que a razão é capaz de mostrar a eternidade de cada ente. A passagem ou oscilação entre o ser do mesmo e o não-ser do mesmo é impossível.
Já a filosofia cristã, tal como é representada por Fabro, Gilson, Vittorio Possenti, Lima Vaz e outros, vê que a superação do niilismo consiste na reafirmação do ser como actus essendi e da sua inteligibilidade radical. Tal reafirmação conduziria a razão ao reconhecimento do Ser subsistente (Ipsum Esse Subsistens) como totalmente inteligível em si mesmo (maxime intelligibile), cuja luminosidade, porém, é escuridão para nós. Assim como o Sol, claríssimo em si mesmo, obscurece os olhos da coruja, a máxima inteligibilidade do Ser perturbaria nossa frágil inteligência e nossa vontade de tudo conquistar e dominar. O Ser é reconhecido por nós como existente, mas sua essência nos cega e destitui do trono nossa vontade de potência. O Ser se apresentaria como totalmente indisponível aos caprichos humanos. Podemos reconhecê-lo, amá-lo, adorá-lo, mas não dominá-lo. Isso apontaria um caminho para a superação do niilismo.
Para Heidegger, diferentemente, o niilismo é causado pelo esquecimento do Ser. Esse esquecimento teria começado já nos inícios da filosofia, com Platão. Esquecer-se do Ser significa confundi-lo com um ente. A metafísica ocidental teria transformado o Ser num ente — o ens summum, o ente supremo (Deus). Perguntando-se pelo sentido do Ser (ontologia), a metafísica teria colocado o seu fundamento no ente supremo (teologia). Esse caráter ontoteológico da metafísica teria encoberto o Ser mesmo, aplainando o caminho do homem para o domínio total do ente. Com Descartes, o processo de redução ao ente tomou o contorno explícito e agressivo da manipulação do ente pela primazia da consciência. Esse processo de esquecimento do Ser teria atingido o seu mais alto grau com Nietzsche, cujo conceito de “vontade de potência” é a expressão mais abrangente do domínio do homem sobre o ente. Vê-se, pois, que, segundo Heidegger, Nietzsche não supera o niilismo nem a metafísica ocidental, mas é a sua expressão mais acabada.
Emanuele Severino, por sua vez, acusa o próprio Heidegger de ser niilista e de promover o niilismo. Não só Heidegger é acusado, mas toda a filosofia ocidental. Severino vê que Parmênides começou a trilhar a estrada justa, mas logo foi “refutado” por Platão. O princípio de Parmênides seria o único verdadeiro: o ser é e não pode não ser; o não-ser não é e não pode ser. Platão, no entanto, defendeu uma passagem — impossível aos olhos de Severino — do não-ser ao ser e do ser ao não-ser. O devir entendido como oscilação entre o ser e o não-ser tornou-se a grande marca do pensamento ocidental. Como suporte do devir assim entendido, como remédio para o vir-a-ser que inquieta a alma, os filósofos, de Platão até Hegel, colocaram o Imutável, reconhecido ao término do trajeto do pensamento: o Bem, o Motor Imóvel, Deus, o Sujeito, o Espírito... No entanto, a oscilação entre o ser e o nada sempre foi uma evidência para a mente ocidental. E a força dessa suposta evidência teria levado a filosofia, a partir do século XIX, a negar qualquer Imutável. A suprema convicção da filosofia do nosso tempo, pensa Severino, é que o devir, entendido como passagem do ser ao nada, reina soberano e, portanto, não pode ser contrastado por nenhum Imutável. Eis o niilismo em sua máxima expressão. A metafísica do Imutável seria impossível porque a suprema verdade seria o devir como oscilação entre o ser e o nada. Ser e nada se confundiriam. Heidegger não supera o niilismo porque o Dasein heideggeriano é um ente que oscila entre o não-ser do antes de ser lançado no mundo e o não-ser para o qual caminha na morte. O ser heideggeriano é apenas uma projeção dos afetos inconstantes do Dasein. Severino propõe como antítodo ao niilismo a verdade do princípio de Parmênides: o ser é. O devir não seria passagem do não-ser ao ser e do ser ao não-ser, mas o aparecer e o esconder-se dos entes eternos no círculo da aparição. Para Severino, que vai até mais longe que Parmênides, cada ente é eterno. Parmênides falava da eternidade do Ser, mas não falava da eternidade dos entes. Severino sustenta que a razão é capaz de mostrar a eternidade de cada ente. A passagem ou oscilação entre o ser do mesmo e o não-ser do mesmo é impossível.
Já a filosofia cristã, tal como é representada por Fabro, Gilson, Vittorio Possenti, Lima Vaz e outros, vê que a superação do niilismo consiste na reafirmação do ser como actus essendi e da sua inteligibilidade radical. Tal reafirmação conduziria a razão ao reconhecimento do Ser subsistente (Ipsum Esse Subsistens) como totalmente inteligível em si mesmo (maxime intelligibile), cuja luminosidade, porém, é escuridão para nós. Assim como o Sol, claríssimo em si mesmo, obscurece os olhos da coruja, a máxima inteligibilidade do Ser perturbaria nossa frágil inteligência e nossa vontade de tudo conquistar e dominar. O Ser é reconhecido por nós como existente, mas sua essência nos cega e destitui do trono nossa vontade de potência. O Ser se apresentaria como totalmente indisponível aos caprichos humanos. Podemos reconhecê-lo, amá-lo, adorá-lo, mas não dominá-lo. Isso apontaria um caminho para a superação do niilismo.
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